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Butão

Butão
Se não tivesse passado os últimos cinquenta anos induzida por anúncios de tv que me mandam ser mais alta, mais loura, mais magra e com os dentes mais brancos, mais forte, mais ambiciosa, e sendo empurrada pra correr e correr a fim de não perder aquela oportunidade que me trará sucesso, e que em vez disso, eu tivesse escutado mais o sopro dos ventos, e observado as montanhas e os rios, e dessa contemplação houvesse moldado minhas conclusões sobre a vida, talvez eu fosse uma pessoa bem diferente. Se eu tivesse nascido no Butão, o país pré-industrial de onde cheguei há dias, seria certamente uma criatura bem distinta da que sou. Em todos os cantos do mundo as pessoas querem ser felizes e vivem por isso, em todos os lugares as pessoas nascem e depois morrem. Somos muito parecidos no final das contas. Mas temos caminhos e modos diferentes. No Butão o lixeiro não passa na porta todos os dias e se o sujeito não reciclar a porcaria que produz, ele será soterrado por ela. Eles são pobres, mas não há miséria. Há duas categorias de pobreza: a falta de comida e a falta de meios pra comprar coisas. Lá existe só a segunda (então eles reaproveitam tudo). Quanto mais complexa as sociedades mais a gente fica irresponsável com os atos pessoais. Alguém cuidará do lixo, alguém cuidará da goteira, do buraco no sapato, da lâmpada que queimou, da roupa pra lavar, da sujeira da rua. 
No Butão não se vende cigarro e não se pode fumar à vista dos outros. Ninguém fuma, faz mal, sabia? Não trás felicidade.
Todos se vestem com o traje local no trabalho e nas escolas, é lei. Não há construções modernas, só a arquitetura local que é feita de pedra, toras de madeira aparente, e adobe pintado de branco ou com motivos religiosos. As casa são espalhadas e quando a gente vem andando do campo pra cidade não se percebe bem onde acaba um e começa o outro.
É um país budista. 
Eu estava almoçando e ao meu lado o monge comia um bife bem gordo. Perguntei:
- Não pode matar e no entanto esse bife...
- Mas não fui eu que matei, a vaca foi morta na Índia.
- Ah tá... a Índia é longe, até chegar no Butão já não tem mais problema?
- Tem sim, mas não é tão grave, disse ele rindo. É que vivo no monastério, e lá comemos o que nos dão. A comida é muito ruim. E esse bife tá tão gostoso!
Pensei que se fosse um padre, estaria cometendo sua falta escondido na sacristia, e esse estava ali, se lambuzando à vista de todos. Ninguém o olhava com ar reprovador. O problema do outro é do outro, é karma dele. Isso por si já vai deixando a gente leve, de um jeito que só se percebe com o passar dos dias. Não há muxoxos e julgamentos, se há, não se sente, tudo é mais livre, solto, e levado no humor. Tvz eu esteja projetando a falta que alguns valores me fazem em nossa sociedade, e romantizando o que senti por lá. Pode ser. Passei treze dias no país, é pouco. Mas vejam, o lugar é lindo, o povo é bom, e a natureza é imensa, himalaica!

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