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A viagem, continuada após a parada em Paris, termina com a notícia do adoecimento de Drops. Um jeito doce de nomear um pai de temperamento difícil. E era assim que Maitê o chamava. A informação chega de forma mágica, pela boca de um desconhecido numa rua qualquer da Índia. O medo de uma morte eminente a traz ao Brasil e bota outros planos em sua vida. Enquanto aguarda a recuperação do pai, atende a palestras sobre cinema no MIS, faz cursos diversos, dá aulas de inglês e francês no CEL-LEP de São Paulo, e começa a estudar teatro com o diretor Antunes Filho.

"O Antunes foi um grande encontro na minha vida. Eu era a melhor amiga da namorada dele e costumávamos passar os finais de semana juntos. Na fazenda de minha amiga, em Minas, gostávamos, por exemplo, de jogar batalha naval e eu ganhava muito dele. A Theo também ganhava dele. Mas ele detestava perder. A batalha naval era coisa séria! Aí quando voltávamos ao curso, ele passava a semana me 'descascando' no palco e me detonava de um jeito que ninguém entendia por quê. Eu não podia dizer o motivo e ficava naquela saia justa esdrúxula, sem saber se ria ou chorava. A intimidade que tínhamos fora do palco se confundia com o trabalho. A gente se hostilizava bastante e eu tive que sair, apesar de adorá-lo e ele a mim — eu sei”.

Antunes foi fundamental na autodescoberta de Maitê enquanto atriz e a proximidade deu partida a uma parceria cheia de oscilações. Nos períodos de trégua na amizade, montaram juntos “Chica da Silva” e “Grande Sertão Veredas”.

“O Antunes não sabe: ele não gosta de TV, mas foi ele que me empurrou para os braços da televisão."

Frente ao novo caminho, pouco depois de assinar o seu primeiro contrato com a Rede Globo, Maitê sofre o acidente que a deixou um ano de cama, cadeira de rodas, muletas, bengala.

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Com o amadurecimento, chega o momento de escolher uma profissão. “Arrisco dizer que ninguém está e ninguém nunca esteve preparado para isso”. Maitê aposta em diversas opções, mas desiste de todas. Tocada pela liberdade, uma vez mais busca clareza na estrada e parte para uma viagem de dois anos por mais de 30 países. Na rota, Europa, África e Ásia. Trabalha vendendo jornais, cuidando de crianças, distribuindo folhetos, o que surgir, e leva tudo o que precisa em uma pequena mochila. Com um sapato, um vestido, um casaco e duas peças mais, explora o que de genuíno existe em si. “Vivi dois anos sem regras de comportamento, experimentando, na ausência de restrições, uma sensação plena de liberdade. Eu era um indivíduo no ápice de sua autenticidade." 

Nova parada em Paris. Novas descobertas. Não poderia deixar de ser lá. A cidade que a despertou e foi fundamental em sua trajetória trouxe também sua primeira experiência com as artes cênicas. Através de Marcel Marceau e Etiènne Decroux, dois dos mestres que deram nova roupagem à mímica no século XX, Maitê ingressa em um curso, que seria trocado pelas cátedras da Sorbonne, que, com sua diversidade, lhe pareceram mais interessantes. A continuidade da viagem também lhe atraía. O mundo estava descortinado, e pulsando em diversas opções, a sua frente. 

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A experiência em Paris trouxe consequências irreversíveis. De volta ao Brasil, a nova Maitê não seria mais subjugada às regras do pensionato luterano e suas restrições religiosas. Fazendo jus ao protagonismo que assumiu em sua história, bate na porta de um padre da cidade. Lança a sorte em um pedido inusitado e é atendida. Acaba por morar um ano na torre da igreja.

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Aos 14 anos Maitê encara a liberdade. Percorre o Brasil e a América do Sul em uma estratégia que permanece até hoje. É na estrada que ela se encontra, se observa e se resolve. "Sempre que preciso resolver alguma coisa, vou resolver longe de casa, longe da 'base' que era sempre meio perturbadora. Isso foi um processo que começou cedo e continua até hoje." 

O nascimento de uma Maitê mais livre traz também o primeiro relacionamento. O rapaz de 18 anos chegou para trazer afeto em forma de paixão. Não houve a entrega. Ao contrário, foi responsável por sua ida à Paris, solução encontrada pelo pai inquieto com a diferença de idade e a inexperiência da filha. Reclusão? Pelo contrário. O mundo se expandiu durante os quatro meses de permanência na cidade-luz.

"Devo meu francês à minha puberdade. Estava naquela época da vida em que falar bem um idioma era fundamental na conquista e no entrosamento com o que interessava: os rapazes. Só que a estratégia do meu pai não deu muito certo porque namorei muito em francês e, na volta, comecei a namorar um amigo do ex-namorado, que por sinal tinha a mesma idade".

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No ano de 1972 , aos 12 anos, Maitê perde a sua mãe. O pai, de certa forma, também vai embora. Parte para reconstruir a vida em outra cidade. Ela e o irmão, agora sós, seguem para um pensionato luterano, onde ficam por três anos. Dos anos no pensionato e na casa de amigos e conhecidos, por onde também passou, surge a adaptabilidade à inconstância.

"Tenho amigos daquela época - com quem dividi casas e quartos - espalhados pelo mundo todo. Eles vinham ao Brasil, ficavam dois anos e iam embora com os pais. Acho que também por isso aprendi a lidar com as coisas efêmeras, a perder as pessoas queridas, a vê-las partir a todo momento, a mudar e mudar."

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