A onda tá braba. Resolvi criar um coral. Juntei umas pessoas, estamos procurando um regente, temos o instrumentista, e vamos cantar! Uma vez por semana aqui em casa. Quem canta seus males espanta. Sugeri um repertório de músicas melodiosas. Nelson Gonçalves, Lupicínio Rodrigues, Dalva, Ataulfo Alves, Elizeth, Irmãs Batista, tangos, boleros, sambas canção, hinos memoráveis, tudo aquilo que ficou num canto da memória, e quando se ouve, traz alegria, saudade e conforto. Cada um sugere uma ou duas canções, escolhemos e cantamos sem compromisso. Porque quando as vozes se juntam, se houver afinação, sempre fica bonito. E podemos dançar. É mesmo pra espantar o baixo astral. E se der caldo a gente se oferece pra cantar na casa das pessoas que estiverem precisando de bom humor. Por via das dúvidas, a gente leva uma erva e deixa num canto defumando durante a cantoria, que las ai las ai… O amigo Diogo V. disse que os donos das casas vão acabar juntando dois mais dois, e desconfiar que a deprê deles dá na vista. Vão se telefonar e perguntar, já cantaram na sua? Não? Ih… tô pior do que pensava. Que nada, nós vamos cantar por nós mesmos, porque somos artistas e é assim que lidamos com a tristeza. E depois se alguém nos quiser, a gente sai por aí. A arte transfere os males pra prateleira da criação, e dela, misturados com a indignação, a garra, e a certeza de que insistindo rola, o mal sai transformado em música, livro, quadro, dança. A arte é alquímica. E acho até que se o coral se aprimorar, podemos passar um chapéu espontâneo, pra render um dinheirinho ao fim das apresentações caseiras. E ainda, se o Coral ficar bom mesmo – supimpa, como diriam nos tempos do samba canção – aí a coisa vira espetáculo e… partimos pros palcos do Brasil!
Esta pessoa que escreve estava triste, macambúzia, desistente, começou a escrever projeções fantasiosas, e pronto já está batendo asas. Viu como funciona? O peso trancado dentro, vira doença. Mas esse outro que a gente põe pra fora em prosa ou verso, ou canto, ou quadro, ou dança – vira mágica.